quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Lindonéia: A Gioconda dos subúrbios na antopofagia brasileira. O Tropicalismo como movimento artístico no Brasil durante a década de 1960.




O tropicalismo foi um movimento artístico-cultural que inicia-se no Brasil durante a década de 1960, momento decisivo da história nacional, onde ocorrem profundas transformações sociais, políticas e até mesmo econômicas no país. As expressões culturais nacionais nos dizem muito sobre o momento histórico brasileiro.

O movimento tropicalista consistiu em uma linguagem expressa nas artes plásticas, música, cinema, teatro entre outras de forma a compor um cenário sincrético de culturas múltiplas, com elementos indígenas, africanos, norte-americanos e europeus, que formam juntas a cultura brasileira de norte a sul do país. No contexto do regime militar brasileiro esta expressão artística revela muito sobre as contradições de um país massacrado pela ditadura. Um expoente do tropicalismo, que surge das artes plásticas é Hélio Oiticica, filho de José Oiticica Filho, que traz monumentos inovadores caracterizando a estética do movimento.





A antiarte inspiradora da Tropicália:

Hélio Oiticica inicia suas obras no início dos anos 60, as mais conhecidas obras são os Parangolés, que representa uma espécie de arte ambulante e os Penetráveis, uma espécie de arte sensitiva que permite o observador se adentrar, no sentido literal da palavra à obra de arte, feita para provocar todos os sentidos.




Hélio Oiticica. Penetrável (1967).





Héio Oiticica. Parangolés (1964).



A Tropicália na música se inspira na arte de Oiticica e se desloca da região nordeste para o sudeste com Caetano Veloso e Gilberto Gil, se integrando ao movimento Nara Leão, Tom Zé, os maestros Rogério Duprat e Torquato Neto, a banda de rock Os Mutantes integrando os diversos segmentos da música brasileira. Elemento fundamental na constituição do tropicalismo foi a premissa de que a cultura brasileira se constitui por um processo antropofágico, onde se absorve o melhor das várias culturas para formar uma múltipla cultura brasileira. Isso foi inspirado pelo Manifesto Antropófago de Oswald de Andrade, escritor de destaque no movimento modernista brasileiro durante a década de 1920, que por sua vez tem origem no quadro Abaporu de sua esposa Tarsila do Amaral. 



Tarsila do Amaral. Abaporu.  (1928).




Tropicália ou Panis et Circencis:
 
O disco manifesto: Tropicália ou Panis Et Circencis sai em 1968 com doze faixas.Entre elas: "Miserere Nobis", ""Geléia Geral", "Panis et circencis", "Parque Industrial", "Baby", "Batmakumba", "Coração Materno", "Enquanto seu lobo não vem", Mamãe Coragem", "Hino do Senhor do Bonfim", "Batmacumba" e "Lindonéia".



Capa do disco de 1968: Tropicália ou Panis et Circencis.






Lindonéia: No avesso do espelho



Entre as doze faixas uma delas é Lindonéia, que teve como inspiração a obra de arte de Rubens Gerchman de 1966. O quadro chamado A Bela Lindonéia (60x60) que traz em sua construção uma imagem caricatural de uma jovem mulher em um suporte de espelho no formato emoldurado de flores ao entorno da imagem, promove a narrativa de uma jovem brasileira que morre aos 18 anos sem conhecer o amor. Lemos no quadro: Um amor impossível. A bela Lindonéia de 18 anos morreu instantaneamente. É possível perceber na imagem a estética da pop arte combinada à arte conceitual que também nos revela outros elementos que implicam em sua narrativa.



 Rubens Gerchman. Lindonéia (1966).



Com base na obra de arte surgiu a música Lindonéia, letra composta por Caetano e arranjos de Gilberto Gil e Rogério Duprat:



Lindonéia (1968). In: Tropicália ou Panis et Circensis.

Caetano Veloso, Gilberto Gil e Rogério Duprat.



Na frente do espelho
Sem que ninguém a visse
Miss
Linda, feia
Lindonéia desaparecida


Despedaçados
Atropelados
Cachorros mortos nas ruas
Policiais vigiando
O sol batendo nas frutas
Sangrando
Oh, meu amor
A solidão vai me matar de dor


Lindonéia, cor parda
Frutas na feira
Lindonéia solteira
Lindonéia, domingo
Segunda-feira


Lindonéia desaparecida
Na igreja, no andor
Lindonéia desaparecida
Na preguiça, no progresso
Lindonéia desaparecida
Nas paradas de sucesso
Ah, meu amor
A solidão vai me matar de dor


No avesso do espelho
Mas desaparecida
Ela aparece na fotografia
Do outro lado da vida

Despedaçados, atropelados
Cachorros mortos nas ruas
Policiais vigiando
O sol batendo nas frutas
Sangrando

Oh, meu amor
A solidão vai me matar de dor
Vai me matar
Vai me matar de dor.










Com base nesta publicação exercite sua análise, acesse o link:
https://docs.google.com/spreadsheet/viewform?formkey=dFBYLXFIeVBRb3JkcHFGS1lybnBlelE6MQ



Glossário:

Antropofágico: antropofagia - s.f. Ato ou hábito de comer carne humana. O ritual de se comer carne humana era característico de alguns povos primitivos e carrega a simbologia que consiste em absorver o melhor das qualidades do outro comendo sua carne. No sentido cultural o termo é aproporiado como termo metafórico para definir um ato de absorver a cultura alheia e transformar em cultura nacional.


Hélio Oiticica: (Rio de Janeiro RJ 1937 - idem 1980). Artista performático, pintor e escultor. Inicia, com o irmão César Oiticica, estudos de pintura e desenho com Ivan Serpa no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro - MAM/RJ, em 1954. Nesse ano, escreve seu primeiro texto sobre artes plásticas; a partir daí o registro escrito de reflexões sobre arte e sua produção torna-se um hábito. Participa do Grupo Frente em 1955 e 1956 e, em 1959, passa a integrar o Grupo Neoconcreto. Abandona os trabalhos bidimensionais e cria relevos espaciais, bólides, capas, estandartes, tendas e penetráveis. Em 1964, começa a fazer as chamadas Manifestações Ambientais. Na abertura da mostra Opinião 65, no MAM/RJ, protesta quando seus amigos integrantes da escola de samba Mangueira são impedidos de entrar, e é expulso do museu.


Manifesto antropófago: escrito por Oswald de Andrade (1890-1954), é publicado em maio de 1928, no primeiro número da recém-fundada Revista de Antropofagia, veículo de difusão do movimento antropofágico brasileiro. Em linguagem metafórica cheia de aforismos poéticos repletos de humor, o Manifesto torna-se o cerne teórico desse movimento que pretende repensar a questão da dependência cultural no Brasil. São inúmeras as influências teóricas identificadas no Manifesto: o pensamento revolucionário de Karl Marx (1818 - 1883); a descoberta do inconsciente pela psicanálise e o estudo Totem e Tabu, de Sigmund Freud (1856 - 1939); a liberação do elemento primitivo no homem proposta por alguns escritores da corrente surrealista como André Breton (1896 - 1966); o Manifeste Cannibale escrito por Francis Picabia (1879 - 1953) em 1920; as questões em torno do selvagem discutidas pelos filósofos Jean-Jacques Rousseau (1712 - 1778) e Michel de Montaigne (1533 - 1592); a idéia de barbárie técnica de Hermann Keyserling (1880 - 1946).


José Oiticica Filho: (Rio de Janeiro RJ 1906 - idem 1964). Fotógrafo, pintor, entomologista e professor. Filho do pensador anarquista e filólogo José Oiticica (1882 - 1957) e pai dos artistas visuais Hélio Oiticica (1937-1980) e César Oiticica (1939), é uma das principais figuras da moderna fotografia brasileira. Forma-se na Escola Nacional de Engenharia em 1930, no Rio de Janeiro. Leciona matemática nos colégios Jacobina, Pedro II, na Faculdade Nacional de Medicina e no Colégio Universitário, entre 1928 e 1962. É entomólogo especializado no Museu Nacional da Universidade do Brasil de 1943 a 1964. Um dos mais influentes membros do movimento fotoclubístico no país, integra o Foto Clube Brasileiro e a Associação Brasileira de Arte Fotográfica, no Rio de Janeiro, e o Foto Cine Clube Bandeirante, em São Paulo.
 

Sincrético: sincretismo - s.m. Sistema filosófico ou religioso que tende a fundir numa só várias doutrinas diferentes; ecletismo. / Amálgama de concepções heterogêneas. / Psicologia Percepção global e confusa que, segundo certos psicólogos, seria a primeira percepção da criança, e da qual emergiriam em seguida objetos distintamente percebidos.



Fontes:


http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic
 

http://www.dicionariodoaurelio.com/




Referências:


COELHO, Cláudio N.P.  A Tropicália: cultura e política nos anos 60. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, São Paulo, 1(2): 159-176, 2. sem. 1989.


NAPOLITANO, Marcos; VILLAÇA, Mariana Martins. Tropicalismo: As relíquias do Brasil em debate. In: Revista Brasileira de História. vol. 18, n. 35. São Paulo: 1998.  

VELOSO, C. Verdade Tropical. São Paulo, Cia das Letras, 1997.

VITAL, Tainá Revelles e GANDRA, Raquel Areias. Lindonéia. Relatório Técnico (Graduação em Comunicação Social, Habilitação em Radialismo) – Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio De Janeiro. Rio de Janeiro, 2010.


Fontes de Internet:









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